Admito. Fui viado. Não homossexual, mas viado mesmo, com todo o sentido pejorativo e preconceituoso que a palavra carrega. E admito isso tranquilamente. Tenho vários amigos gays e acho absurdo que ainda hoje “viado” seja considerado xingamento. Por isso assumo. Sim, fui viado por exatos 2298 dias.
Meu primeiro dia como viado foi o primeiro dia de dezembro de 2003. No dia anterior assisti meu time vencer pela primeira vez o Campeonato Brasileiro (de acordo com a mídia e a CBF, que não consideram os torneios disputados de 1959 a 1970), principal torneio futebolístico do país. Dos 12 maiores times do Brasil, o Cruzeiro era o único que até então não havia vencido e, apesar de já ter na bagagem 2 Libertadores e 4 Copas do Brasil, nós torcedores éramos alvo constante de zoação de nossos rivais, que haviam obtido tal exuberante título nos idos de 71.
A grande maioria daqueles que gargalhavam em minha face tinham idade próxima à minha. Nascidos na década de 80 não tiveram a oportunidade de comemorar um grande título conquistado pelo Atlético Mineiro. Já eu, diferente disso, vi ano após ano o erguimento de taças de grande porte. A torcida, outrora de maioria indiscutível, passava a ficar para trás a cada nova pesquisa feita, ou a cada levantamento em dia de clássico nas arquibancadas. Isso explica o porque de eu ter de ouvir a todo momento: “seu time é pequeno! Nunca ganhou um brasileiro! Um time para ser considerado grande tem que ter ganho um brasileiro!”. Não os julgo por isso. Era seu único e (até certo ponto) coerente argumento.
Porém no dia 30 de novembro de 2003 este argumento veio abaixo. E exatamente no dia 1 de dezembro do mesmo ano pela primeira vez tive minha sexualidade colocada em xeque por torcer para meu time do coração. De um dia para o outro eu deixei de ser o torcedor que nunca havia ganhado um título brasileiro para ser o torcedor “viado”.
Não estou dizendo que nenhum cruzeirense nunca foi chamado de gay, viado, homossexual ou coisa que o valha antes disso. Estou dizendo que EU nunca havia sido chamado assim. E sempre estive em todo tipo de discussão futebolística que se poderia imaginar. O argumento na hora do aperto era apenas um: o título brasileiro de 71. Era, porque a partir de então, o único “argumento” passou a ser: “ah..mas pelo menos eu não sou viado”.
Mas depois de 2003 a coisa veio mudando aos poucos. A presença do Dr. Marcelo no BBB8 já dava indícios de que não dava mais para se usar este “argumento”. E enfim, no dia 16 de março de 2010 finalmente deixei de ser “viado”. Não acho legal utilizar o argumento “viado” como forma de denegrir a imagem de alguém. Muito menos quando isso é utilizado para aumentar ainda mais a homofobia que existe no meio futebolístico. Mas é evidente que se este tipo de argumento for usado, o alvo principal será aquele time que primeiro lançou uma camisa na cor rosa.